E quero fumar o meu cigarro, sem que o fumo te afaste. Quero senti-lo, senti-lo até ao meu último bafo, como se no meu maço, não restasse nada a não ser o vazio de um cigarro. As memórias acenderam, as dúvidas vestiram-se de incertezas e levei o espaço de um cigarro para amar-te de novo. Puxei todas as tuas, ou melhor, as nossas memórias, travei-as, como o stop de uma música e dispersei-as pela minha varanda, depois de as reproduzir. Toquei-me que sempre moras-te aqui. É uma sensação física, que me trespassa o corpo cada vez que me lembro do tempo em que entravas por esta porta e dificilmente saías. E é se saías. Deixou de haver tempo, os meus segundos envolviam-se nos minutos de um beijo teu demorado, nas horas vagas de um tempo preenchido em ti, em nós. Conseguíamos atingir a perfeição quando os berros e o tiroteio de palavras era interrompido pelo desejo que sentíamos um pelo outro. Apertavas-me contra ti, e eu, eu mergulhava nos teus braços e no calor do teu corpo, sem pensar na hipótese de me largares. A tua loucura enlouquecia-me, apaixonava-me cada vez mais pela tua diferença e só dava por isso, no sabor amargo que a vida ganhava quando estavas ausente. Eras tão calado e discreto. Eras sempre o melhor em tudo e não havia mulher alguma que pudesse resistir aos teus encantos, inclusive eu. O teu cabelo despenteado e desmazelado, até no teu sorriso guardavas mistério. Misteriosa é a estufa de sentimentos a que me submetes. Foste e não levas-te fumo contigo. É no espaço de um cigarro que reinas o meu coração e ele, na tua presença, me conta um livro do terror que é não estares aqui, do romance que é ainda amar-te e da aventura que foi ter-te na minha vida. Não há meio de ires, sem me despedir de ti. E sabes, sabes que odeio despedidas. Tenho que deixar-te ir contra a minha vontade, tenho que me armar em 'boa-menina' e dizer que quero que sejas feliz com ou sem mim. Mas não, não quero, estou-me nas tintas. Não há ninguém que te faça tão feliz, como o meu amor permite que eu to faça. Porque é que preferes ir de carro e não vais a pé? Porque é que o maço tem de estar cheio, se o único cigarro que me faz falta és tu? Se é ele quem me submete a uma estufa de sentimentos contraditórios, reviver as nossas memórias, a amar-nos. Eu amo-nos, porque no espaço de um cigarro, tive-nos de volta. (...) Foi o meu último cigarro, o maço está vazio, não esfumes o que nos une a km de distância. Não o faças, não apagues, faz-nos bem ter-nos de vez em quando, no espaço de um cigarro.

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